Assine nossa newsletter e fique por dentro de tudo que rola na sua região.
Especialistas apontam que medidas propostas extrapolam competência estadual e podem ser questionadas judicialmente
A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) tenta aprovar Projeto de Lei 5.908/25, conhecido como Pacote de Enfrentamento ao Crime (PEC-RJ), de autoria do presidente da Casa, deputado Rodrigo Bacellar (União). O pacote, composto por 19 artigos, visa fortalecer a segurança pública e reforçar a efetividade penal no estado, mas tem enfrentado severas críticas de especialistas em direito constitucional.
Entre as medidas mais controversas do pacote aprovado estão a criação do Sistema Estadual de Cerco Eletrônico Inteligente (SISCEI/RJ), que utilizará inteligência artificial e reconhecimento facial para monitorar egressos reincidentes, e a proibição do direito à visita íntima para apenados condenados por crimes hediondos. O projeto também prevê o ressarcimento parcial dos custos de manutenção carcerária pelos próprios detentos, limitado às despesas com alimentação, vestuário e higiene pessoal.
Juristas e professores de direito constitucional têm alertado que várias dessas propostas extrapolam a competência legislativa estadual, invadindo áreas de atribuição exclusiva da União do Congresso Nacional.
A regulamentação de direitos e deveres de apenados, como visitas íntimas e ressarcimento de custos prisionais, é matéria que, segundo a Constituição Federal, compete privativamente ao Congresso legislar. pois só de muda Lei federal com Lei federal. Essa invasão de competência torna as normas vulneráveis a questionamentos judiciais que podem resultar em sua declaração de inconstitucionalidade.
A implementação de sistemas de monitoramento que envolvem reconhecimento facial e análise de dados sensíveis também levanta sérias questões sobre privacidade e conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Especialistas em direito digital argumentam que a coleta e processamento de dados biométricos em larga escala, sem regulamentação federal específica, pode violar princípios fundamentais de proteção à privacidade estabelecidos na legislação nacional.
O contexto político em que o pacote foi aprovado também tem sido objeto de críticas. A iniciativa surge em meio a uma disputa política entre o presidente da Alerj, Rodrigo Bacellar, e o governador Cláudio Castro, com o deputado apresentando as propostas antes mesmo do Executivo estadual. Essa corrida por protagonismo na área de segurança pública tem sido vista por analistas como um teatro político que compromete a qualidade técnica da legislação produzida.
Organizações da sociedade civil e entidades representativas da advocacia manifestaram preocupação com o precedente estabelecido pela aprovação de normas potencialmente inconstitucionais. Membros da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Rio de Janeiro, tem sinalizado que pode questionar judicialmente as medidas, argumentando que a insistência em aprovar leis sabidamente problemáticas representa má utilização de recursos públicos e gera insegurança jurídica.
Analfabetismo jurídico ou propaganda enganosa?
O Supremo Tribunal Federal já consolidou entendimento sobre os limites da competência legislativa estadual em matéria penal e processual penal, estabelecendo que estados não podem legislar sobre direitos e garantias fundamentais de presos, execução penal ou criação de tipos penais. Esses precedentes jurisprudenciais tornam ainda mais frágil a base legal do pacote aprovado pela Alerj.
Professores de direito constitucional de universidades fluminenses têm usado o caso como exemplo didático em suas aulas, demonstrando aos estudantes como identificar vícios de inconstitucionalidade em proposições legislativas. O fato de que mesmo acadêmicos em formação conseguem detectar os problemas jurídicos evidencia a fragilidade técnica das propostas aprovadas.
A situação levanta questionamentos sobre a qualidade da assessoria jurídica que orienta os parlamentares estaduais na elaboração de projetos de lei. Especialistas sugerem que há necessidade de maior rigor técnico na análise prévia de constitucionalidade das proposições, evitando o desperdício de tempo legislativo e recursos públicos com normas juridicamente inviáveis.
Além dos aspectos constitucionais, o pacote também enfrenta críticas por sua efetividade prática no combate à criminalidade. Especialistas em segurança pública argumentam que medidas puramente punitivas, sem investimento em prevenção e ressocialização, têm eficácia limitada na redução dos índices de violência.
A experiência internacional demonstra que políticas de segurança baseadas exclusivamente no endurecimento penal não produzem os resultados esperados em termos de redução da criminalidade.
O caso da Alerj ilustra um problema mais amplo no cenário legislativo brasileiro: a tendência de parlamentares aprovarem leis populistas em temas sensíveis como segurança pública, mesmo quando essas normas apresentam vícios evidentes de constitucionalidade. Essa prática, além de comprometer a qualidade da legislação, gera expectativas falsas na população e pode configurar o que especialistas classificam como propaganda enganosa institucional.
A eventual declaração de inconstitucionalidade das medidas pelos tribunais superiores não apenas invalidará os esforços legislativos, mas também poderá gerar responsabilização por improbidade administrativa dos gestores públicos envolvidos na aprovação de normas sabidamente inconstitucionais. O Tribunal de Contas do Estado já sinalizou que pode investigar o uso de recursos públicos na tramitação de proposições juridicamente inviáveis.
O episódio serve como alerta para a necessidade de maior rigor técnico e responsabilidade institucional no processo legislativo estadual. A aprovação de leis inconstitucionais não apenas representa desperdício de recursos públicos, mas também compromete a credibilidade das instituições democráticas e pode induzir a população a erro sobre seus direitos fundamentais.
Referência: Alerj - Assembleia aprova Pacote de Enfrentamento ao Crime
#AlerjaRJ #SegurançaPública #DireitoConstitucional #DesperdícioPublico #InconstitucionalidadeRJ #JuristasRJ #AssembleiaRJ #RecursosPublicos #LegislaçãoEstadual #DireitoPúblico
Nenhum comentário. Seja o primeiro a comentar!