Armar Parte da Guarda Municipal é Política de Segurança ou Politicagem?

Armar Parte da Guarda Municipal é Política de Segurança ou Politicagem?

Hoje, acordamos com a notícia de que uma delegacia foi atacada para resgatar dois criminosos, um atentado que representa uma agressão brutal e desrespeitosa ao Estado. Enquanto o crime desafia as autoridades com um nível de ousadia sem precedentes, a Câmara dos Vereadores se prepara para receber uma proposta que pretende armar apenas parte da Guarda Municipal, como se essa fosse a resposta para o caos que enfrentamos.

Nos últimos anos, a defesa do armamento da Guarda tem sido uma bandeira dos bolsonaristas, que insistem em tratar a segurança pública apenas pelo viés do confronto, ignorando suas causas estruturais. Essa nunca foi uma pauta da esquerda, que historicamente prioriza a valorização dos servidores, políticas preventivas e um modelo de segurança pública que vá além da simples distribuição de armas.

Agora, no Rio de Janeiro, um projeto propõe armar parte da Guarda Municipal, mas com uma contradição perigosa: ao final do expediente, os agentes deverão entregar suas armas e voltar para casa desarmados. A questão que precisa ser feita é: essa medida realmente fortalece a segurança pública ou apenas expõe os próprios guardas a mais riscos?

O agente passará o dia exercendo uma função que o coloca em rota de colisão com criminosos, sendo visto prendendo pessoas armadas, lidando com conflitos e enfrentando situações de alto risco. Mas, quando o turno termina, ele simplesmente volta a ser um cidadão comum, sem nenhuma proteção adicional.

E onde moram esses profissionais? Como voltam para casa depois de um dia exercendo a função de “super-heróis” nas ruas? Seus salários não permitem que vivam em condomínios de luxo, com segurança privada ou deslocamento protegido.

Muitos pegam transporte público ou moram em áreas dominadas pelo crime organizado, onde podem sofrer represálias. Essa realidade foi levada em consideração ao propor essa medida?

A situação se torna ainda mais absurda quando comparamos com a luta dos policiais penais, que há anos reivindicam o direito ao porte de arma fora do serviço. Eles argumentam, com razão, que o risco não desaparece no fim do expediente – quem prende criminosos não pode ser visto como alvo apenas durante o horário comercial. Se essa lógica se aplica aos policiais penais, por que a Guarda Municipal seria tratada de maneira diferente?

Além disso, essa proposta não atende às principais reivindicações da categoria. Os guardas municipais não pedem armas. Pedem um plano de carreira digno, melhores condições de trabalho e valorização profissional. Se a intenção fosse realmente fortalecer a Guarda, esse deveria ser o foco. Mas, em vez disso, temos um projeto que se alinha muito mais a uma estratégia política do que a uma política de segurança pública eficiente.

O município enfrenta desafios reais na área da segurança, que exigem planejamento, integração entre as forças e políticas públicas eficazes. Criar uma categoria de guardas armados apenas durante o expediente e desprotegidos fora dele não é política de segurança, é politicagem.

Se queremos de fato modernizar a segurança pública, a solução não está apenas no armamento, mas no uso estratégico da tecnologia. Hoje, criminosos já utilizam drones para monitorar a movimentação das forças de segurança em comunidades dominadas pelo tráfico. Se essa tecnologia está sendo usada contra as autoridades, por que a Guarda Municipal não pode empregá-la para patrulhar a cidade de forma mais eficiente?

Além disso, o uso de satélites de baixo alcance poderia ajudar na identificação de criminosos e na localização de esconderijos, apoiando tanto a segurança municipal quanto a estadual. Recursos como reconhecimento facial, inteligência artificial e monitoramento remoto já são realidade em diversos países, mas aqui seguimos insistindo em soluções ultrapassadas que colocam mais vidas em risco do que efetivamente combatem o crime.

A segurança pública do futuro não se faz apenas com armas, mas com inteligência, tecnologia e estratégias inovadoras. Está na hora de deixarmos a politicagem de lado e pensarmos em soluções reais para proteger os cidadãos e os agentes que arriscam suas vidas todos os dias.

Paulo Ciro da Silva Mendonça
(Sobrevivente da guerra urbana, policial reformado após 30 anos de serviços prestados. Enquanto especialistas de papel teorizam sobre segurança sem nunca ter dado um tiro, eu só tento entender por que continuamos repetindo os mesmos erros e esperando resultados diferentes.)

Por Jornal da República em 18/02/2025
Aguarde..