E se eu te contar?: A prisão em ruínas diante do Pão de Açúcar que já foi o 'Alcatraz Brasileiro'

E se eu te contar?: A prisão em ruínas diante do Pão de Açúcar que já foi o 'Alcatraz Brasileiro'

Por Jéssica Porto

 Escondido em plena Baía de Guanabara, o Forte da Laje carrega uma história pesada — literalmente construída sobre um rochedo — que a maioria dos brasileiros jamais ouviu falar. Apelidado de “Alcatraz Brasileiro” por sua função como prisão de segurança máxima isolada no mar, esse antigo bastião militar recebeu nomes como Bento Gonçalves, Olavo Bilac e até Jânio Quadros. Hoje, o que resta é um monumento em ruínas, entregue à maresia, à ferrugem e ao esquecimento.

A construção remonta ao século XVI, quando o francês Villegagnon instalou ali uma bateria de canhões. A fortaleza que conhecemos, no entanto, começou a tomar forma em 1710 e foi concluída por volta de 1716. Durante séculos, ela cruzou fogo com outros fortes para proteger a entrada da baía e garantir a segurança da cidade do Rio de Janeiro.

Com o passar dos anos, o local deixou de ser apenas uma estrutura defensiva. Transformou-se em prisão de alta segurança, temida por suas celas escuras e úmidas, onde muitos considerados inimigos políticos ou figuras controversas eram enviados ao isolamento absoluto. José Bonifácio, Marquesa de Santos, Tobias Aguiar... A lista de presos ilustres impressiona e revela o peso simbólico do local.

Após a Revolta da Armada, no fim do século XIX, o forte foi modernizado. Ganhou uma cúpula de aço e canhões Krupp. Na Segunda Guerra Mundial, teve uma rede antimina submersa para impedir a entrada de embarcações inimigas. Em 1953, foi rebatizado como Forte Almirante Tamandaré, mas perdeu sua função estratégica e acabou desativado. Atualmente, está fechado ao público e sem qualquer uso prático, ao contrário de outras fortalezas da orla carioca que foram restauradas e se tornaram pontos turísticos ou centros culturais.

Tentativas de resgate e abandono

Mesmo com tamanha importância histórica, o Forte da Laje não teve o mesmo destino das fortalezas vizinhas. Tentativas de revitalização foram feitas. Uma delas ocorreu em 2002, quando o Exército — responsável pela estrutura por meio do Centro de Capacitação Física, na Urca — chegou a realizar um levantamento de custos para restauração. Porém, os valores foram considerados altos demais.

Uma proposta mais ousada surgiu em 2012, quando a empresa Plancton Comércio e Representações arrendou o espaço com planos ambiciosos: transformar o local no “Espaço Laje”, um restaurante japonês e centro de eventos com capacidade para até mil pessoas. A ideia incluía atracadouros flutuantes, deques removíveis e acesso via botes infláveis saindo da Marina da Glória, da Urca e até de Niterói. A previsão inicial era de inaugurar tudo até os Jogos Olímpicos de 2016.

Mas, como muitas promessas no Rio de Janeiro, o projeto esbarrou na burocracia e na realidade do patrimônio tombado. Como o Forte da Laje faz parte da zona de proteção do sítio considerado Patrimônio da Humanidade pela Unesco, qualquer obra precisava do aval do Iphan e do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade. Apesar de ter recebido uma autorização do Iphan em 2008, a validade do documento expirou e as obras nunca começaram. O projeto foi engavetado, e a empresa hoje aparece como inativa. O custo estimado da restauração, segundo cálculos de um historiador, era de pelo menos R$ 40 milhões — valor muito acima do inicialmente previsto pelos investidores.

 

  O que resta, infelizmente, é o silêncio. O silêncio de um lugar que já rugiu com canhões e vozes de presos ilustres. Um lugar que poderia ser ícone de memória e turismo, mas permanece invisível, desmoronando em meio à Baía de Guanabara.

E se eu te contar que parte da nossa história está literalmente desmoronando diante dos nossos olhos?

Fonte: O Globo, Cultura em Movimento, FUNCEB

Fotos: Divulgação/Internet

Por Jornal da República em 03/05/2025
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