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A recente movimentação da China para adquirir uma participação na Vast Infraestrutura — operadora do terminal de petróleo do Porto do Açu (RJ) — reacende um debate sensível no Brasil: até que ponto é seguro permitir que potências estrangeiras, especialmente por meio de estatais, assumam o controle de ativos estratégicos?
O anúncio foi feito pela China Merchants Port Holdings (CMPORT), braço do conglomerado estatal China Merchants Group. A negociação, ainda sujeita à aprovação regulatória, prevê a aquisição de uma fatia da subsidiária da Prumo Logística, empresa responsável pelo desenvolvimento do complexo portuário do Açu, um dos mais importantes do país.
Um terminal estratégico para o petróleo brasileiro
Embora a transação não envolva a totalidade do Porto do Açu — que abriga 11 terminais e 28 empresas —, a presença chinesa na Vast é altamente simbólica e estratégica. O terminal da Vast é o único na América do Sul habilitado a receber navios do tipo VLCC (Very Large Crude Carrier), fundamentais para o escoamento de grandes volumes de petróleo. Atualmente, o Açu movimenta cerca de 560 mil barris de petróleo por dia, com potencial para mais que dobrar essa capacidade.
Esse protagonismo logístico faz da Vast um ativo de peso dentro da cadeia de exportação de petróleo nacional, o que justifica as preocupações de especialistas em segurança e soberania.
A diplomacia dos portos e o avanço chinês na região
O movimento da CMPORT não é isolado. A estatal chinesa tem ampliado sistematicamente sua atuação na infraestrutura portuária da América do Sul. Já detém o Terminal de Contêineres de Paranaguá (PR), participa de iniciativas no Porto de Santos (SP) e projeta um terminal no Maranhão. No exterior, a atuação do China Merchants Group já gerou polêmicas, como no caso do porto de Hambantota, no Sri Lanka, onde a falta de pagamento de empréstimos levou o governo local a conceder à estatal chinesa o controle de 80% do porto por 99 anos.
Esses antecedentes levantam dúvidas sobre as reais intenções por trás dos investimentos — ainda que sob a aparência de parcerias comerciais legítimas.
Sinais de alerta para o Brasil
Para o professor Marcos Pedlowski, da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), o caso da Vast é mais um passo dentro de uma estratégia coordenada da China para consolidar presença em áreas-chave de exportação de commodities. Ele alerta que o monitoramento das operações nesses portos já é limitado, e a entrada de uma estatal estrangeira pode dificultar ainda mais a fiscalização.
“Não se trata apenas de uma questão econômica. O controle de áreas estratégicas por empresas estatais de outro país compromete a autoridade nacional e levanta dúvidas sobre o acesso do Estado brasileiro a dados e operações sensíveis”, afirma Pedlowski.
Parceria ou risco à soberania?
Em nota, a Prumo Logística afirmou que a transação está alinhada com sua estratégia de buscar parceiros globais para acelerar o desenvolvimento do Porto do Açu. Já a CMPORT destacou sua posição como operadora de referência no setor portuário internacional, com presença consolidada em diversos continentes.
No entanto, críticos questionam os reais efeitos de tais alianças. O temor é de que a entrada da CMPORT marque o início de um processo de “sinicização” da infraestrutura logística brasileira, onde interesses estratégicos nacionais acabem subordinados a decisões de uma potência estrangeira.
O papel das autoridades brasileiras
Com a negociação ainda em análise, cabe aos órgãos reguladores brasileiros avaliar os impactos a longo prazo da operação — não apenas sob o ponto de vista econômico, mas também geopolítico e de segurança.
Num momento em que o Brasil busca protagonismo na transição energética e no mercado global de petróleo, manter o controle sobre seus pontos-chave de exportação se torna uma questão estratégica. A eventual ampliação da influência chinesa em infraestruturas críticas como o Porto do Açu exige uma resposta clara e fundamentada do Estado.
A venda de participação na Vast Infraestrutura para a China não significa a entrega do Porto do Açu, mas acende um sinal amarelo. Mais do que nunca, o Brasil precisa equilibrar o interesse por investimentos externos com a preservação da soberania nacional. A história recente mostra que, no tabuleiro geopolítico global, portos não são apenas portas de entrada e saída — são peças-chave no jogo de poder entre nações.
Fonte: Click Petroleo e Gas
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