Assine nossa newsletter e fique por dentro de tudo que rola na sua região.
O futuro da liberdade de expressão na internet brasileira está no centro de uma disputa jurídica no Supremo Tribunal Federal (STF). O foco da controvérsia é o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que desde 2014 garante que plataformas digitais só sejam responsabilizadas por conteúdos de terceiros após decisão judicial — com exceção de casos já previstos em lei, como nudez não consentida e violação de direitos autorais.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, publicada nesta terça-feira (24), o presidente do Google Brasil, Fábio Coelho, manifestou preocupação com a possibilidade de o STF promover uma mudança drástica nesse dispositivo legal. Segundo ele, alterações amplas no artigo 19 podem levar a empresa a adotar medidas mais restritivas no país, como a remoção preventiva e frequente de conteúdos, inclusive jornalísticos.
“A gente espera que se preserve um princípio fundamental: quem deve decidir o que é removido e o que não é removido é a Justiça e não as plataformas”, afirmou Coelho. Para o executivo, embora o Google esteja aberto a ajustes pontuais — como a inclusão de crimes graves entre as exceções à regra —, uma revisão radical pode ter efeitos colaterais indesejados. “Isso pode nos tornar um pouco menos partícipes de todas as discussões que ocorrem no Brasil e nos levar a remover mais conteúdo no país”, disse.
Liberdade de expressão ameaçada
A possível responsabilização antecipada de plataformas acende um alerta entre juristas, jornalistas e defensores da liberdade de expressão. Na prática, caso o artigo 19 seja enfraquecido, redes sociais, buscadores e sites de hospedagem poderão optar por remover conteúdos com base apenas em denúncias ou por receio de processos, mesmo sem decisão judicial. Isso poderia comprometer o debate público, a produção jornalística independente e a difusão de denúncias contra autoridades e grupos poderosos.
O cenário aponta para um risco de censura privada e de autocensura, em que empresas digitais evitam litígios eliminando conteúdos legítimos. Além disso, especialistas temem que tal movimento concentre ainda mais o poder de produção e distribuição de informação nos grandes grupos de mídia tradicionais, como o Grupo Globo, que historicamente influenciam o discurso público no Brasil.
Nos últimos anos, a proteção jurídica assegurada pelo Marco Civil permitiu o florescimento de novos veículos jornalísticos, projetos investigativos e iniciativas independentes de comunicação digital. Com uma eventual mudança na legislação, esse ecossistema corre o risco de ser severamente impactado.
Eleições, precedentes e incertezas
Fábio Coelho também lembrou a decisão do Google de suspender a veiculação de anúncios políticos nas eleições municipais de 2024, após a imposição de regras consideradas inviáveis pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para ele, o episódio ilustra como regulações mal calibradas podem afastar grandes empresas do debate democrático.
Com novas eleições previstas para 2026 e a discussão do artigo 19 em andamento no STF, o futuro da atuação de plataformas no Brasil permanece incerto. O temor de que mudanças precipitadas possam comprometer o livre fluxo de informações e a pluralidade de vozes no ambiente digital torna o debate urgente.
A decisão do STF terá impactos profundos não apenas para as empresas de tecnologia, mas para toda a sociedade brasileira. Em jogo estão o direito à informação, a liberdade editorial e a garantia de que a Justiça, e não interesses privados ou pressões políticas, determine os limites da liberdade de expressão online.
Fonte: Brasil247