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Como diria o ditado popular, "quando a casa cai, não sobra nem o alicerce". E é exatamente isso que está acontecendo com o Partido Liberal na Câmara dos Deputados. Em uma manhã que deveria ser como qualquer outra, a Polícia Federal deflagrou uma operação que atingiu em cheio a cúpula da bancada do PL, mirando diretamente no líder Sóstenes Cavalcante e no deputado Carlos Jordy, ambos do Rio de Janeiro.
A investigação não é novidade no radar das autoridades. Trata-se de um desdobramento de uma operação iniciada há um ano, quando apenas assessores dos parlamentares estavam na mira. Agora, a PF cumpre sete mandados de busca e apreensão expedidos pelo Supremo Tribunal Federal, investigando desvios de recursos públicos através das cotas parlamentares. O que chama atenção é o montante encontrado na residência de Sóstenes: R$ 400 mil em espécie, uma quantia que levanta questões sobre a origem e destinação desses valores.
A reação dos envolvidos segue o roteiro já conhecido. Jordy classificou a operação como "perseguição implacável", enquanto Sóstenes prepara uma entrevista coletiva no Salão Verde da Câmara para apresentar sua versão dos fatos. É uma estratégia de comunicação que busca transformar investigação em narrativa de vitimização, um recurso frequentemente utilizado quando os argumentos jurídicos se mostram insuficientes.
A sangria de mandatos
O timing da operação não poderia ser mais simbólico. Menos de 24 horas antes, o presidente da Câmara, Hugo Motta, havia cassado os mandatos de dois deputados do PL: Alexandre Ramagem e Eduardo Bolsonaro. O primeiro, condenado a 16 anos de prisão por tentativa de golpe, encontra-se foragido nos Estados Unidos há três meses. O segundo perdeu o mandato por acumular quase 60 faltas injustificadas, também refugiado em território americano há quase um ano.
A situação de Eduardo Bolsonaro é particularmente emblemática. Seu autoexílio nos Estados Unidos tem como objetivo declarado buscar apoio internacional para livrar o pai da prisão. É uma missão que revela tanto a dimensão internacional das articulações políticas quanto a fragilidade da posição do ex-presidente no cenário doméstico.
Alexandre Ramagem, por sua vez, representa o ápice da estratégia de fuga como resposta à Justiça. Condenado pelo STF, orquestrou sua saída do país de forma calculada, transformando-se em foragido internacional. Sua trajetória ilustra como alguns políticos preferem o exílio à responsabilização, uma escolha que compromete não apenas sua credibilidade individual, mas também a do partido que representam.
O rastro de Carla Zambelli
A semana anterior já havia sido marcada pela cassação do mandato de Carla Zambelli, também do PL. A deputada, que possui duas condenações judiciais - uma delas por tentativa de invasão do sistema da Justiça Eleitoral -, seguiu o mesmo caminho de seus colegas de bancada: a fuga para o exterior. Capturada na Itália, aguarda agora o processo de extradição, numa demonstração clara de que a justiça internacional não oferece o refúgio que muitos imaginavam.
O caso Zambelli é revelador da estratégia adotada por parte da bancada do PL: quando a pressão judicial aumenta, a resposta é a fuga. É uma postura que contrasta drasticamente com o discurso de enfrentamento e coragem que caracteriza a retórica pública desses políticos.
Silêncio estratégico de Valdemar
Em meio a essa tempestade, chama atenção o silêncio do presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto. Político experiente, ele compreende que qualquer manifestação neste momento pode ser interpretada como endosso ou abandono de seus filiados. Sua estratégia parece ser aguardar que a poeira baixe antes de definir os rumos do partido.
Esse silêncio, contudo, não é neutro. Ele revela a complexidade da situação interna do PL, que precisa equilibrar a defesa de seus quadros com a preservação da imagem institucional. Com as eleições presidenciais de 2026 no horizonte, cada movimento é calculado pensando no impacto eleitoral futuro.
A reação da oposição
A resposta da oposição às cassações foi imediata e contundente. Sóstenes Cavalcante classificou as decisões como "esvaziamento da soberania nacional", uma retórica que busca elevar o debate do campo jurídico para o político. O senador Rogério Marinho, líder da oposição no Senado, aproveitou o momento para defender a reforma do Poder Judiciário, transformando a crise particular do PL em bandeira mais ampla da oposição.
Essa estratégia de generalização é compreensível do ponto de vista político, mas revela também a dificuldade de defender casos específicos que envolvem evidências concretas de irregularidades. Quando os fatos são desfavoráveis, a saída é questionar o sistema que os julga.
O contexto de Bolsonaro preso
Todos esses eventos ocorrem sob a sombra da prisão de Jair Bolsonaro, líder máximo do partido. Sua ausência cria um vácuo de liderança que se reflete na falta de coordenação das respostas às crises. Sem a figura centralizadora do ex-presidente, cada deputado reage de forma individual, comprometendo a coesão da bancada.
A prisão de Bolsonaro também altera a dinâmica interna do partido. Quadros que antes gravitavam em torno de sua figura agora precisam redefinir alianças e estratégias, criando um ambiente de incerteza que facilita a eclosão de crises como a atual.
Fogo amigo no governo
Paralelamente à crise do PL, o governo enfrenta suas próprias turbulências internas. A decisão unilateral do senador Jaques Wagner de fechar acordo que resultou na aprovação do PL da Dosimetria, sem anuência do Planalto, criou constrangimento público entre governo e base aliada.
O episódio, que envolveu troca de acusações entre Wagner e a ministra Gleisi Hoffmann, ilustra como a falta de coordenação pode comprometer até mesmo governos bem estruturados. A situação se tornou tão insustentável que Wagner já estuda deixar a liderança em 2026.
As estratégias de sobrevivência
Diante do cenário adverso, o PL busca estratégias para manter sua relevância política. A sigla compreende que, apesar das crises atuais, possui uma base eleitoral sólida que não pode ser desperdiçada. O desafio é separar os problemas individuais de seus quadros da imagem institucional do partido.
Uma das apostas é a renovação de quadros, promovendo lideranças menos expostas aos escândalos atuais. Outra estratégia é o investimento em pautas que mobilizem sua base, mantendo a conexão emocional com o eleitorado independentemente das turbulências jurídicas.
O impacto na articulação política
A sequência de crises compromete seriamente a capacidade de articulação do PL no Congresso Nacional. Com lideranças investigadas, presas ou foragidas, torna-se difícil manter a coesão necessária para influenciar votações importantes. Essa fragilidade pode ser explorada tanto pelo governo quanto por outros partidos de oposição.
A perda de protagonismo no Congresso tem reflexos diretos na capacidade do partido de influenciar a agenda política nacional. Sem uma bancada forte e articulada, o PL corre o risco de se tornar coadjuvante em debates que considera fundamentais.
Reflexos eleitorais futuros
As crises atuais certamente terão impacto nas eleições de 2026. A questão é saber se esse impacto será suficiente para comprometer as chances eleitorais do partido ou se a base bolsonarista permanecerá fiel independentemente dos escândalos. A experiência internacional mostra que eleitores podem perdoar irregularidades quando se identificam fortemente com a narrativa política de um partido.
O PL aposta na capacidade de sua base de separar os problemas individuais de seus quadros da proposta política mais ampla. É uma estratégia arriscada, mas que pode funcionar se bem executada.
A crise atual do Partido Liberal na Câmara dos Deputados representa mais do que uma sequência de problemas isolados. Ela revela a fragilidade de uma estrutura política construída em torno de lideranças personalistas e pouco institucionalizada.
Veja quanto Sóstenes e Jordy, alvos da PF, gastaram com aluguéis de carros desde 2023
Os deputados federais Jordy e Sóstenes, ambos do PL do Rio de Janeiro, acumularam, juntos, R$ 742,3 mil em despesas com locação ou fretamento de veículos automotores desde o início da atual legislatura, em 2023, segundo levantamento a partir de dados do Portal da Transparência da Câmara dos Deputados. Os gastos são o principal eixo da investigação que levou a Polícia Federal (PF) a deflagrar, nesta sexta-feira, 19, uma operação contra endereços ligados aos parlamentares.
Desde janeiro de 2023, Carlos Jordy declarou R$ 328 mil em despesas com aluguel de veículos, o que corresponde a uma média mensal de R$ 10,5 mil. Os gastos seguem padrão recorrente, com valores entre R$ 10 mil e R$ 12,7 mil por mês, com pico de R$ 12,7 mil em novembro e dezembro de 2024.
No mesmo intervalo, Sóstenes Cavalcante registrou R$ 414,3 mil, com média mensal de aproximadamente R$ 11,8 mil, em valores próximos de R$ 12,7 mil ao longo da maior parte da legislatura.
Desde o início da atual legislatura, em 2023, Sóstenes Cavalcante contratou seis empresas para serviços de locação ou fretamento de veículos. A Ilha Locação de Veículos recebeu R$ 130,5 mil, enquanto a Amazon Serviços e Construções foi paga em R$ 116,5 mil. Também constam nos registros pagamentos à Harue Locação de Veículos, que recebeu R$ 48,1 mil; à Alfa Auto Car Locadora de Veículo, com R$ 32,2 mil, à Shekinah Locação de Veículos, com R$ 47 mil, e à Maior Med Soluções em Saúde, que recebeu R$ 40 mil do gabinete do parlamentar.
No mesmo período, Carlos Jordy contratou cinco empresas para a mesma finalidade. A Tagg Services recebeu R$ 98 mil; a Segbrasil Comércio e Serviços, R$ 87,1 mil; a Pantanal Veículos, R$ 49,5 mil; a Harue Locação de Veículos, R$ 70 mil; e a Alfa Auto Car Locadora de Veículos, R$ 23,4 mil.
A operação desta sexta-feira cumpre sete mandados de busca e apreensão no Distrito Federal e no Rio de Janeiro, por determinação do ministro Flávio Dino, relator do caso no STF. Durante as diligências, a PF apreendeu cerca de R$ 430 mil em dinheiro em espécie em um endereço ligado a Sóstenes, em Brasília.
PL em 2026
O caminho para a recuperação passa necessariamente pela renovação de quadros e pela construção de uma estrutura mais sólida, menos dependente de figuras individuais. Caso contrário, o PL corre o risco de ver sua influência política se deteriorar de forma irreversível, transformando-se em uma legenda de segunda linha no cenário nacional.
A política brasileira observa com atenção os próximos movimentos do partido. Sua capacidade de superação desta crise pode determinar não apenas seu futuro, mas também o equilíbrio de forças no Congresso Nacional nos próximos anos.
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